terça-feira, 30 de abril de 2013

as terras do fim

tinha o toque das pétalas, tão suave e doce, tão cálido e intenso por tão breve.
a brisa passava mansa nas colinas do vale, agitando a primavera.
Benedita suspirou e ajeitou-se no leito de esteva e giesta. Tinha cruzado o regato das terras do fim, ali onde os ventos segredavam carícias. Tinham-lhe dito que nas terras do fim a água beijava os lábios que a bebiam e as pessoas acordavam nos seus sonhos de meninas. Agitou a cabeça e espraiou os cabelos sobre os cheiros da esteva. o deslizar salpicante do regato murmurava-lhe o caminho da fonte.
rolou sobre o corpo e aspirou o fresco da flor de giesta. deslumbrou-se com os tufos de amarelo intenso que atapetavam o relevo e a água chamava-a...como rasto de esteva quente caminhou para o fim das terras do fim, onde estava a fonte.
encostou-lhe os lábios e acordou no sonho.
tinha o toque das pétalas, tão suave e doce, tão cálido e intenso por tão leve.

segunda-feira, 22 de abril de 2013

o silêncio de mim

encontrei-me com o silêncio de mim. era um cais de partidas e chegadas, de pontes entre movimentos. os bancos estavam despidos de gente, excepto aquele que lá ao fundo quase se perdia na bruma do silêncio. chegava de lá o som vago de uma melodia, uma canção de embalar "..vai-te embora gavião.....deixa dormir o menino..". Aqueceu-me o coração, pintou-me de rubor a face e embalei no meu peito o sonho.
os saltos soaram sólidos quando caminhei para o o fim do cais, onde nascia a melodia.
- Olá, - disse eu à menina de chapéu de palha e balão na mão - como te chamas?
- Benedita - disse-me olhando-me de olhar esperto. Saltou do banco e cantarolou .."de cima desse telhado"..deu-me o balão e desvaneceu-se na bruma!
- Olá!- disseram-me do banco, num som cálido e doce - come se chama?
- Benedita - disse eu.
- Sente-se comigo Benedita, - disse-me a mais bela anciã - cante-me uma canção.
Cantei-lhe uma canção de embalar. Ela encostou os cabelos brancos no meu peito e adormeceu.
Encontrei-me com o silêncio de mim, um cais de partidas e chegadas.

domingo, 21 de abril de 2013

no teu sopro


o vento soprou de mansinho. amaciou as paredes sujas do mosteiro e transportou o grasnar das cegonhas pelos meandros sombrios das entranhas das ruínas.
Lá dentro as heras caíam em grossas melenas pelos torreões e o mundo parecia acabar.
"E tu,
no voo das cegonhas
levas-me no teu sopro, o breve instante do ondular do meu cabelo no teu rosto, quando em mim te encostas e  o meu dorso esmagas no tronco da oliveira.
e eu
levo-te no meu sopro, o breve instante em que foste vento, quando em ti me embebo, trepadeira verdejante do tempo de primavera"
as cegonhas agitaram o silêncio das paredes, como um sopro, cortaram o azul do céu.
- até onde nos encontrarmos com as estrelas, quero que me leves no teu sopro! disse-lhe Sindala.

quinta-feira, 18 de abril de 2013

o looping e a carruagem de cristal

por vezes o nada encharca de tudo aqueles momentos...zen?! então fecho os olhos...............................

embalo o corpo e danço. de repente a estrada faz um looping e o carro cai. o caminho é estreito e jinga nas colinas da serra, dança comigo uma dança de roda mas está difícil saber quem tem o anel.
O sol amarra-se no horizonte na hora dos dourados e vermelhos quentes, por vezes lascivos. A dança percorre um espaço que se julga floresta e eu finjo que ainda uso diáfanos tecidos e que posso voar. Cheguei ao cabo. o farol abre caminhos no escuro. não sei se escorregue para a água se embarque nas sombras das ravinas. a estrada em looping mudou-me o horizonte, é agora o cruzeiro do sul que me ilumina o céu, ainda que eu saiba que não é aí que estou.
Ah, bom ali está uma porta. passo, porque não sei se entro se saio e encontro-me com as acácias, naqueles cachos de pó amarelo...parece-me que o sol veio ter comigo.
um abraço rodeia-me o colo e o bafo quente do meu amor chega-me ao coração. no meu regaço descansa o rosto, no meu regaço o acaricio.
o looping da estrada desfaz-se. o carro torna-se a minha carruagem de cristal. agora vou cinderela em busca do sopro no meu regaço, talvez escorregue para o mar...
O Sol picou-me as pálpebras, espreguicei os olhos e acordei. Sorri quando olhei a carruagem de cristal e o meu amor me bafejou...

domingo, 14 de abril de 2013

sabes-me a sal

saboreou-lhe o corpo. o sal que o sol lhe secara na pele adoçava-lhe os lábios. sentia-lhe a pele quente e o roçar ondulante de sal e de moura.
Quis-lhe os lábios sobre o peito, um beijo em regato no leito da nuca, desaguado na boca, salgado ardentemente salgado.
e o mar agitava-se-lhes nos corpos, vagas intensas e cavadas, o sal a morder-lhes a pele. Ele entre as coxas dela, ela nele enlaçada.
roçou-lhe os dedos sobre o ombro, afastou-lhe o cabelo da testa, sobre a orelha. beijou-lhe a ponta do nariz e descansou-lhe o rosto sobre o peito.
- Sabes a mar, princesa!
- Sabes-me a  sal, amor.

sexta-feira, 12 de abril de 2013

remanso

se me imaginas, vivo
se me imaginas, morro
porque te imagino,
de amor vivo e morro.

se me imaginas, desperto
se me imaginas, descanso
porque te imagino
de amor desperto e descanso

se me imaginas, porque te imagino
em ti vivo e morro
em ti desperto e descanso
amor, meu amor
meu remanso