sábado, 17 de agosto de 2013

a flor distraída

procurou os cachos sob as parras. queria-os de bagos sumarentos e doces, daqueles que se trincam e estalam nos beiços e logo refrescam a boca.
cabia-lhe na palma da mão. era um cacho bem apessoado, quase elegante. desatracou-o da vide, um golpe seco com a navalha, e amparou-o com a mão.
aberto o tapete de plantas verdes por onde passeavam umas cabra-cegas, mergulhou o cacho no fresco frio das águas da mina. e a água dançou ao sabor dos bagos...
Maria mostrava-lhe uma nesga das coxas por entre as folhas desordenadas da hera que enredava o tronco da cerejeira grande. sabia-a recostada na manta a dormitar a languidez, a pele sedosa a aguardar-lhe o toque.
Sorriu. Envolveu o cacho em duas parras e colheu a flor distraída de uma planta que não conhecia o nome. Maria dormia, envolveu-a com o olhar quente e de manso aconchegou-se pertinho dos ombros dela.
-Maria..-sussurrou-lhe- e devagarinho passou-lhe o cacho fresco sobre os lábios.
Partiram de mãos dadas. Maria levava no decote a flor distraída de que Luis não conhecia o nome.

Sem comentários:

Enviar um comentário