terça-feira, 12 de julho de 2011

O assalto às Rennie

adorava pastilhas Rennie, as que faziam bem à digestão. De vez em quando conseguia um pedacinho que chupava gulosamente deixando que aquele sabor a espuma de farinha doce refrescasse o hálito quando aspirava o ar circulante.
As Rennie faziam parte do tesouro que todos os dias procurava encontrar, devassando gavetas e recantos de toda a casa. A actividade era extremamente perigosa. A ameaça de umas chineladas apenas a tornava mais audaz.
O crime de assalto e roubo, vandalizando os lenços e as echarpes, as cuecas e as camisas, aconteceu um dia, quando encontrou a caixa das Rennie, quase cheia.
Agachou-se na lateral da cómoda e descansada e sorrateira chupou, uma a uma, todas as pastilhas, deliciando-se, no fim da cada uma, com a frescura vibrante do ar aspirado através dos dentes cerrados que se prolongava pela língua e céu da boca como se um regato de ar por ali se escoasse.
Na última pastilha o coração começou a bater mais depressa ao olhar para o chão pejado de papéis plásticos e a caixa tombada e aberta.Do castigo não se safava e o medo estava a crescer. E, se morresse? A mãe bem lhe tinha dito que aquilo era remédio. A quase certeza das chineladas era um "fait divers", o problema era se morria e a mãe a castigava por isso.
-Dilita, onde estás? - ouviu a mãe, e encolheu-se mais, atenta a qualquer sinal de dor de barriga, que não chegava.
- Dilita, ecoava em prolongado som a voz da mãe, já sabes que se mexeste nas gavetas o chinelo está à espera.
Dilita encostou a cara à ponta da cómoda e espreitou a porta que se abriu num repente para deixar entrar a mãe.
Nem um som, um bom puxão de orelhas, fê-la levantar do chão e perceber que não estava a morrer. Estava bem viva, escapar às chineladas foi uma sorte, afinal a mãe tinha receio que as Rennie pudessem ter-lhe feito mal, por isso a diminuição da pena.
Não escapou foi à dor de barriga que mais tarde a incomodou e quando se queixou à mãe que a encostava no regaço, logo se arrependeu pela resposta:
-A menina portou-se mal por isso lhe dói a barriga e para a próxima o chinelo está à espera!
Este é que era o castigo, mas estava contente, não tinha sido castigada por morrer.

Sem comentários:

Enviar um comentário